Sempre lembrado por antiga comparação com Messi, Taison mantém bom humor e comemora ida ao Mundial

  • ExtraOnline
  • 18/05/2018 07:14
  • Brasil e Mundo

De chinelo e agasalho em um fim de tarde primaveril na Ucrânia, o gaúcho Taison larga o chimarrão, recosta-se no sofá e espera as perguntas com um sorriso no rosto e uma das pernas em cima da almofada. Ao lado da noiva, Gabriela, e de alguns amigos, confirma que o boxeador americano Mike Tyson foi a inspiração para seu nome.

— Mas não tenho muita cara de durão, né? — pergunta ele, antes de falar dos dez irmãos que cresceram ao seu lado em Pelotas (RS).

Quando um vizinho ucraniano toca a campainha, o atacante de 30 anos, do Shakhtar Donetsk e da seleção brasileira observa orgulhoso:

— Ele aprendeu a falar português rapidinho com a gente.

Taison não tem cinco Bolas de Ouro, nem quatro Ligas dos Campeões, tampouco três Mundiais de Clubes. Não é Messi, como as redes sociais insistem em lembrar — e tripudiar. Neste caso, o pivô da piada também acha graça. Há quem tente medir seu sucesso a partir da comparação com o craque argentino, iniciada há dez anos com um texto do jornalista gaúcho Wianey Carlet, já falecido. Multicampeão no futebol ucraniano e um dos 23 nomes que representarão o Brasil na Copa do Mundo de 2018, Taison não precisa de tanto para ser feliz:

— Conquistei o que eu queria. Falei para a minha mãe que seria jogador de futebol, fui. Falei que mudaria a vida dela, graças a Deus estou mudando. Falei uma vez que chegaria à seleção, hoje estou. Então, nada do que falam me atinge. Podem até falar de mim, mas falem as coisas certas. Procurem saber um pouco da minha vida, só um pouco.

‘Isso trouxe um peso para minha carreira’, diz o atacante

Carlet foi um dos primeiros jornalistas a entrevistar Taison, na época uma promessa no Internacional. Em 2009, com boas atuações e gols, o atacante foi comparado a outro atleta com os mesmos 20 anos, que conduzira o Barcelona ao primeiro título de Liga dos Campeões da era Guardiola. Em sua coluna, Carlet fez um apelo para que o jovem gaúcho não fosse ignorado à sombra do argentino que encantava a Europa: “Taison ou Messi, o futuro dirá quem foi melhor”. Nas redes sociais, onde o passado se cristaliza instantaneamente em documentos acessíveis a um clique, a frase cunhada por Carlet passou a ser revisitada a cada momento genial de Messi. Ou seja, constantemente.

— Isso pegou para sempre, cara! Na época, a comparação não me assustou muito. Depois, quando o Messi começou a ganhar tudo… — observa Taison, antes de dar um suspiro: — Até trouxe um peso para minha carreira. Estou no Shakhtar, né? E o Messi, no Barcelona. O peso maior é esse. As pessoas ficam: “como o cara vai ser comparado com o Messi e está num clube de menor expressão?”. Mas a vida é assim, né? Vou trabalhando, e as coisas… Agora levo só na esportiva.

Taison guarda até hoje uma camiseta estampada com a frase, que ganhou de presente de membros do programa humorístico “Pretinho básico”, da Rádio Atlântida, há três anos. O próprio Wianey Carlet, morto em setembro passado, participou da entrega.

Sem vergonha das tuitadas do passado

Há quem se envergonhe de frases do passado que não se encaixem no presente, mas este não é o caso de Taison. A repercussão exagerada de atos inocentes, pelo contrário, tornou-se um passatempo para Taison tanto quanto seu chimarrão e as caminhadas pelo condomínio onde mora há quatro anos em Kiev.

Ele recebe, a todo momento, notificações em seu Twitter de compartilhamentos e “favoritadas” de publicações pessoais de sete, oito anos atrás. São letras de pagode, breves confissões sentimentais e muitos “boa tarde” e “boa noite” em formatos variados.

— Postava “eu te amo” em russo. Botava “boa noite” em russo e português. Foi bem na época em que cheguei na Ucrânia, sozinho… Pegava as coisas e postava (risos). Coisa de moleque — diverte-se Taison, que confessa se perder em meio a tantas notificações: — Nunca pensei que fosse dar esse sucesso todo. Hoje em dia não posto, só vejo as pessoas falando.

Numa época em que redes sociais de craques são administradas por assessores, dedicados a peneirar qualquer ruído e torná-las assépticas, a simplicidade de Taison gera espanto e diversão. Depois que ele foi convocado para a Copa, seu celular não parou de apitar, com mensagens de parabéns e avisos de que mais publicações antigas eram relembradas por internautas. Outra vez, o atacante ri, sem mostrar necessidade de renegar o passado.

Um dos pilares da reconstrução do Shakhtar

Taison chegou à Ucrânia em 2010, jogou por três anos no Metalist, de Cracóvia, e se transferiu para o Shakhtar Donetsk numa temporada que acabaria em meio à guerra entre governo ucraniano e separatistas pró-Rússia. Alguns brasileiros do time, como os meias Douglas Costa e Fred — também convocados para a Copa —, não quiseram voltar ao Donetsk para o reinício do campeonato. Taison, por outro lado, até hoje mostra saudade da cidade, que teve que mudar seus treinos para Kiev e seus jogos para Cracóvia depois da guerra.

Taison viu o Shakhtar perder dinheiro, talentos e até seu estádio, a moderna Arena Donbass, ao longo do conflito armado. Ao ficar, consolidou-se como homem de confiança e um dos pilares da reconstrução do time. Nesta temporada, usou a braçadeira de capitão e liderou o time até as oitavas de final da Liga dos Campeões, com direito a vitórias sobre Napoli, Manchester City e Roma, time que eliminou o Barcelona de Messi na etapa seguinte, as quartas de final.